Localizada a 170 quilômetros de Natal, a cidade de Currais Novos é
famosa pelo mundo devido à exportação de xelita, cujo ciclo teve seu
auge entre as décadas de 1940 e 1990. Da terra onde brotou este mineral,
que é matéria-prima do tungstênio, também surgiu a desigualdade social e
a criminalidade com o passar do tempo. Mas graças ao projeto "Criança
no Rumo Certo", hoje, surgem cidadãos de bem através da prática do
esporte.
Antes dos treinos, 'aconselhamento' acontece embaixo
do pé de algaroba (Foto: Arquivo Pessoal/Cedida)
O responsável pela iniciativa é o professor Nilton César, que aos
quatro anos chegou à região do Seridó Potiguar para morar no bairro Dr.
José Bezerra, mais conhecido como Promorar. A região periférica tinha um
dos índices de violência mais altos de Currais Novos. Lá, Nilton viu
seus amigos se envolverem com todos os tipos de droga. Cansado dessa
realidade, surgiu a ideia de tirar as crianças do mau caminho em abril
de 2002. Aqui sempre teve um alto consumo de drogas. Meus amigos se tornaram
viciados. Alguns já morreram e têm outros presos. Vendo isso, me senti
na obrigação de fazer alguma coisa. Tornei-me presidente do conselho do
bairro e criei o projeto - lembra o treinador de 38 anos, natural de
Campo Redondo. Hoje, são cerca de 280 alunos cadastrados. No turno da manhã, sempre às
quartas-feiras, sextas e sábados, os garotos jogam futebol no
"Galvãozão", um campinho de terra, cuja única sombra é do pé de
algaroba. Debaixo da árvore e antes de cada treinamento, Nilton comanda
um bate-papo que ele prefere chamar de aconselhamento com a garotada.
Todo tipo de assunto é tratado e, até por isso, uma vez por mês
acontecem palestras com médicos, policiais, psicólogos, entre outros
profissionais convidados. Ao final dos treinos, a garotada faz fila para
receber o esperado copo de doce de leite, que não pode faltar. O campo na verdade é o estacionamento do parque de vaquejadas. Uma vez
por ano, o grupo tem que procurar outro lugar para não parar o projeto
durante a semana do tradicional evento da cidade. Ambos os terrenos
estão longe de ser o ideal. Há apenas as traves e a marcação com cal.
Qualquer chute dado faz rolar a bola, levanta a poeira e leva junto as
pedras soltas, mas, segundo o idealizador do projeto, não é nada que
desestimule seus alunos. Nunca recebi uma reclamação desses meninos, seja porque o lanche vai
ser sopa, a bola é de má qualidade e o campo é de terra. É incrível como
o esporte promove o bem. Não há reclamações por parte dos meninos. Ao longo desses 10 anos, algumas pessoas já apareceram para ajudar, mas
apenas Nilton permaneceu desde o começo. Entre os "Amigos do Projeto"
estão uma panificadora da cidade, que doa o lanche, e a prefeitura que
começou colaborar, neste ano, com R$ 1.000 mensais, mas não paga há dois
meses. A grande ajuda mesmo fica por conta da família de Nilton. A esposa e as
quatro filhas coordenam o núcleo feminino do projeto. No turno da
tarde, as meninas praticam handebol, vôlei, futsal e queimada na quadra
de uma escola do bairro.
Cerca de 2.000 alunos já passaram pelo 'Rumo Certo'
(Foto: Arquivo Pessoal/Cedida)
Mais de 2.000 alunos já passaram em nossas mãos. E hoje tem gente
casada, pai de família, empregados... Atendemos crianças a partir dos
oito anos, mas também têm jovens com mais de 20 anos que nos procura.
Por dados da Polícia Civil, nessa idade que o projeto atende, os índices
de ocorrência diminuíram - comemora o coordenador. Usando a bola como ferramenta de transformação social, a meta do
Criança no Rumo Certo não é descobrir jogadores, e, sim, fazer um
trabalho de orientação. Por isso, o líder comunitário faz questão de
conversar com os pais dos alunos e procura saber como eles estão na
escola. E todo final de ano e aniversário do projeto organiza uma
confraternização com os jovens e suas famílias.
Memé já foi aluno do projeto Rumo Certo e hoje
está no ABC (Foto: Arquivo Pessoal/Cedida)
No entanto, os meninos mais talentosos acabam se destacando. Foi o caso
dos irmãos Max e Memé. Ambos foram alunos durante a infância e neste
ano jogaram pelo Currais Novos Esporte Clube – treinado por Nilton César
–, na segunda divisão do Campeonato Potiguar de profissionais. O
atacante Memé, de 19 anos, despertou a atenção dos clubes de Natal, e
está no sub-20 do ABC. Minha meta é continuar esse projeto. Hoje é realidade em Currais
Novos e tem sido importante para a vida de muitos jovens e adolescentes.
O que conta para mim é ver a transformação de um aluno que chega como
'de risco' e melhora as notas da escola, a relação com a família. Não
tem nada melhor que participar da mudança dessas pessoas - finaliza o
professor Nilton César.
OPINIÃO DO BLOG: Vai a dica aí para o poder público. A cidade do Assu/RN poderia ter um projeto deste tipo para a garotada da região.
Por Matheus Magalhães
Natal / blogtatutomsports.blogspot.com.br