Imóvel onde foi fundado o América-RN em 1915 (Foto: Klênyo Galvão/GloboEsporte.com)
A 14 de julho de 1915, um diminuto grupo de rapazes reuniu-se em uma
pequenina casa", construída nos fundos da residência do juiz Joaquim
Homem de Siqueira, localizada na Rua Vigário Bartolomeu, na Cidade Alta,
bem no centro de Natal. O objetivo do encontro era fundar o América
Futebol Clube, que surgiria com camisas azuis e só mais tarde assumiria o
vermelho como cor símbolo, tomando como referência o América do Rio de
Janeiro, fundado em 1904. Duas semanas antes da histórica data, o ABC
havia sido criado em outro bairro da capital e começava ali a rivalidadecentenária. Depois de um incidente envolvendo a destruição de uma bola e
uma indenização da polícia, os garotos que já jogavam bola juntos
encontraram a motivação que faltava para criar o novo clube potiguar.
A citação que abriu esta matéria foi retirada de uma carta enviada
por um dos fundadores, Oscar Homem de Siqueira, ao então presidente do
clube em abril de 1948 - José Rodrigues de Oliveira -, explicando
detalhes sobre a fundação na casa de seu pai. De acordo com o primeiro
vice-presidente do Mecão, 28 sócios-fundadores estiveram presentes no
ato, inclusive o seu irmão, Carlos Homem de Siqueira. Outra versão,
apontada pelo pesquisador e membro do Instituto Histórico e Geográfico
do Rio Grande do Norte, Luiz G. M. Bezerra, dá conta de 27 fundadores.
De acordo com Bezerra, tal informação foi "prestada pelo esportista
Carlos Fernandes Barros, possuidor de uma cópia da ata da fundação,
também fundador e por mais de 15 anos secretário do América". Juntando
as duas listas e eliminando os nomes que se repetem seriam, então, 34 os
fundadores do clube.
De qualquer modo, o feito completa 100
anos e, um século depois, o neto de um desses fundadores, Carlos Homem
de Siqueira Neto, aos 63 anos, relembra a curiosa história da bola
rasgada que culminou na criação do Alvirrubro.
Time do América-RN em 1932: Everardo é o primeiro agachado à direita (Foto: Everardo Siqueira Homem/Arquivo pessoal)
Na minha
adolescência eu ouvi muitas histórias do meu avô contando,
principalmente, o fato do início do clube, de quando aconteceu o
incidente no antigo campo de pelada, no terreno onde hoje é
Catedral Metropolitana (na Avenida Deodoro). Eles estavam batendo uma
peladinha, quando o chefe de polícia
passou pelo meio do campo e a bola o atingiu no rosto, derrubando os
óculos dele. Aí ele mandou rasgar a bola. Nosso tio-avô, tio Oscar, era
advogado já nessa época. Então, ele foi ao pai dele, que era juiz de
Direito da cidade de Natal, para pedir providências. Mas o pai se
sentiu incapacitado de julgar pelos filhos estarem envolvidos. Então,
encaminhou a causa para outro juiz, que deliberou que o chefe de polícia
pagasse uma indenização aos garotos. Dessa indenização, eles compraram
uma bola nova, que serviu de motivação para eles fundarem o América, já
se baseando também na fundação do ABC, um mês antes, por um outro grupo
de amigos, que eram amigos deles, inclusive - contou Carlos Homem de
Siqueira, neto de um dos fundadores.
Também
neto de Carlos Homem de Siqueira, Everardo recebeu este nome em
homenagem ao capitão Everardo, que jogou no América em 1932 e é
considerado um dos grandes ídolos da época. Aos 55 anos, o comerciante
não esconde a satisfação de vivenciar a comemoração do centenário do
clube criado por seus antepassados.
Everardo Homem de Siqueira é neto de um dos fundadores (Foto: Klênyo Galvão)
- A história da fundação chegou até mim através do meu pai (Cleantho Homem de Siqueira), porque meu
avô faleceu há muitos anos, quando eu ainda era criança, e ele não
tratava muitos desses assuntos com a gente. Através do nosso pai,
ficamos sabendo que nosso avô Carlos e tio Oscar tinham sido uns dos
principais do grupo que fundou o América, na casa do meu bisavô Joaquim.
A partir daí, nosso interesse pelo América só aumentou. O prazer foi
muito grande. Saber que a gente é parente dos fundadores do América: isso é realmente incrível! -
exclamou Everardo, garantindo que todos da família, sem exceção, são torcedores do América.
Em
um passeio pelo Centro de Natal, não é difícil chegar ao antigo prédio
que abrigou aquela reunião que fundaria o América Futebol Clube e
outrora servira de república para os irmãos Carlos e Oscar Homem de
Siqueira.
Proprietário há 18 anos do imóvel que sediou aquele encontro, Severino Ramos Duarte conta que descobriu há apenas três
meses o valor histórico do local, onde hoje funciona um sebo de livros e
vinis raros. A descoberta veio através de uma pesquisa feita pelo escritor Carlos Gomes,
junto à família Homem de Siqueira, que está preparando um livro sobre o
centenário. Agora que sabe que ali foi fundado o América, mesmo
torcendo para outro time da cidade, o comerciante diz que não vende o
prédio por nada.
- Eu fiquei contente, apesar de ser torcedor do Alecrim. Fiquei bem satisfeito com a informação. Estou quase virando
a casaca (risos). Na verdade, acho que já sou metade americano, porque é
um time que admiro, muito forte e organizado. E agora valorizou o
imóvel, né? Para comprar barato, não compra mais, não - disse o dono do
sebo que receberá uma placa alusiva à fundação do América naquele local.
Fanático
pelo clube, Everardo Homem de Siqueira não nega o orgulho de ter a
história do América correndo nas veias, mas lamenta duas ausências neste
momento tão especial para a família e para a cidade: a do filho Felipe,
que está estudando na Irlanda e "coitado, vai perder a festa em Natal";
e a do pai Cleantho, que faleceu em 2012.
- É um orgulho
muito grande mesmo. Nós estamos tendo o prazer de viver essa data e
gostaríamos muito que nosso pai estivesse aqui; por pouco ele não
conseguiu. Faz dois anos e meio que ele se foi. Para ele seria
emocionante demais mesmo - disse Everardo, emocionado.
Para
Carlos Homem de Siqueira, o neto, comemorar o centenário do América é
como ver um próprio membro da família "firme, forte e ainda em fase de
crescimento".
- É aquela sensação de que uma coisa criada pelo nosso avô chega a essa idade, 100 anos, pujante, forte e como uma das paixões da cidade. Isso é motivo de muito orgulho para nós - exaltou Carlos.
- É aquela sensação de que uma coisa criada pelo nosso avô chega a essa idade, 100 anos, pujante, forte e como uma das paixões da cidade. Isso é motivo de muito orgulho para nós - exaltou Carlos.
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